“Não há nada que o governo possa lhe dar que não tenha tirado de você antes.” A célebre frase de Winston Churchill se encaixa perfeitamente no chamado “Crédito do Trabalhador”, uma nova modalidade de empréstimo consignado para empregados CLT. A promessa do governo? Taxas de juros mais baixas. A realidade? Um paliativo populista que ignora problemas estruturais e coloca o trabalhador em uma armadilha financeira.
Isso porque a medida permite que até 10% do saldo do FGTS (Fundo de Garantia por Tempo de Serviço) e 100% da multa rescisória sejam usados como garantia para os bancos. Na prática, isso significa que, caso o trabalhador seja demitido, parte desse dinheiro que deveria servir como “proteção”, será direcionado diretamente para a instituição financeira.
Em suma, o FGTS — que historicamente apresenta rentabilidade abaixo da inflação — agora servirá de lastro para o endividamento. Essa medida cria um paradoxo: a população não tem liberdade para gerir o próprio FGTS, mas pode usá-lo para tomar dívidas. Na prática, o governo está usando o dinheiro do trabalhador para garantir créditos a ele mesmo.
A narrativa oficial é de que as taxas de juros dessa modalidade serão “mais acessíveis”. Ainda que seja um valor inferior ao crédito pessoal comum, está longe de ser uma solução viável. Segundo dados do SPC Brasil, 46% dos brasileiros não sabem controlar seu orçamento. Diante desse cenário, o crédito consignado pode agravar essa situação, pois além do risco de endividamento excessivo, a margem consignável limita uma parte do salário, comprometendo o orçamento para outras despesas essenciais.
Ademais, nada impede que as taxas de juros aumentem. Isso porque, diferentemente do consignado do INSS e do funcionalismo público, que tem juros limitados a 1,85% ao mês, o governo não impôs um teto para os bancos. Logo, cada instituição financeira poderá definir suas próprias condições, de acordo com a “avaliação de risco” do trabalhador, que considera fatores como tempo de serviço, salário e garantias.
É válido destacar que a implantação desse crédito ocorre em um momento estrategicamente favorável ao governo, com as eleições presidenciais se aproximando. Medidas que facilitam o acesso a crédito tendem a criar uma ilusão de prosperidade e movimentar o consumo no curto prazo — ainda que isso signifique um endividamento maior da população.
Os efeitos já aparecem. De acordo com a DataPrev, empresa de Tecnologia e Informações da Previdência, o empréstimo consignado privado já ultrapassa R$3,1 bilhões em operações. Além do mais, estima-se que até 19 milhões de trabalhadores recorram ao Crédito do Trabalhador nos próximos quatro anos, o que pode representar mais de R$120 bilhões em empréstimos contratados.
Se o objetivo fosse, de fato, fortalecer a segurança financeira dos trabalhadores, a solução passaria por incentivar a liberdade de escolha sobre o próprio dinheiro. Medidas como a liberação do FGTS para investimentos e consumo, aliadas à redução da carga tributária sobre os salários, teriam um impacto real na renda e no poder de compra. Em vez disso, o “Crédito do Trabalhador” é apenas mais uma forma de manter os brasileiros dependentes do Estado, enquanto os bancos lucram e o governo tenta se fortalecer.
Tays Marina é Economista (UFPE). Pós graduanda em Economia e Investimentos (USP). Consultora na Ph Neves Consultoria Econômica